segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Tantos deuses, tantos credos / Tantos caminhos que serpeiam, serpeiam

Insegurança. Esta é a palavra mais próxima que poderia definir Teobaldo Miranda. Sempre visto como um garoto tímido, introspectivo, bondoso e assexuado.

Desde os primórdios de sua existência seus pais notaram nele características atípicas para uma criança de sua idade. Terapias, psicólogos, ativades de lazer e esportes foram investidos por eles durante sua formação até ele atingir a idade de 19 anos. Quando o próprio se convenceu de que não iria mais conseguir ajuda desse tipo de profissionais. Estranhezas à parte, Teobaldo tinha uma vida funcional na sociedade. Formou-se em uma faculdade e tinha seu grupinho de amigos. Pessoa fragilizada, a sua maior dificuldade era em lidar com sua sexualidade. Seus amigos mais queridos tratavam o tema como tabu, visto que esse assunto o magoava.

Sempre buscando uma forma de se aceitar ou ser aceito pela sociedade, Teobaldo considerou como melhor solução ingressar na carreira de monge, pois sua fragilidade poderia ser fantasiada na condição celibatária de um Monastério. Mas mesmo assim, Teobaldo sabia que não era o suficiente para sanar -se perante si mesmo. Por isso vinha debatendo internamente e externamente com seus amigos mais queridos esta ideia ao longo dos anos. Tentava gradativamente se diagnosticar em algum grau de fobia social.


Ele tinha um cargo médio em uma empresa privada. Fora do mercado de trabalho, seus programas (os considerados cults), eram cinemas, cafés, sarais e campeonatos de esportes diversos. Não transava álcool, drogas e nem avançava noite a dentro em festas. Morava só com a ajuda dos pais em um modesto apartamento no Distrito Federal. Este sempre limpo.

Mas dúvidas, incertezas e fragilidades marcavam a sua vida. Mas como diz aquela expressão: “quem muito escolhe acaba sendo escolhido”. O amor bateu na porta de Teobaldo na altura de seus 26 anos.

Janaína era uma menina meiga. Ambos foram se aproximando aos poucos dentro da empresa onde eles trabalhavam. O primeiro contato deles aconteceu quando Teobaldo foi designado para ensinar o santo ofício para a nova estagiária.
Depois de uma semana de repasse do material de trabalho, aconteceram longas e elucubrativas conversas sobre temas de interesse dos dois jovens enamorados. Poesia, música clássica, pop e lirismo. Ambos saíram para curtir sons e dançar por aí na noite. Conflitos existenciais de ambos também foram discutidos, como as coisas que mais magoam um ao outro, problemas com aceitação dos próprios pais. Suas fragilidades. Visões de Deus e do que seria a vida após a vida. E principalmente: porque o mundo não é ideal. Porque os seres humanos praticam a maldade entre si mesmo e os outros seres do reino animal.

Como em um conto de almas gêmeas, dois corações puros finalmente se aceitaram. Com muita maturidade, ele aos seus 26 e elas aos 22 anos, encaram o desafio de assumir um relacionamento sem o nunca ter feito antes. Essa aceitação foi feita após seis meses de intercâmbio cultural, quando ocorreu o primeiro beijo.

Amor puro e verdadeiro, um boom de carinho, compaixão, cumplicidade e zelo entre dois corpos. Amor perfeito sem vacilos. Apenas candidices. Sem casarem, Maria já dormia praticamente todas as noites com Teobaldo. Servir o ser amado com amor: este era o destino imortal de ambos. Depois de dois anos, o único conflito entre ambos era o fato de Teobaldo dizer a Janaína que ainda não estava pronto para ter um filho.

Sete anos se passaram desde o primeiro beijo quando ocorreu este episódio marcante na vida do casal. Dentro da cabeça de Teobaldo o encanto foi quebrado. Ele, questionando em um ensimesmamento, teve um acesso de raiva e frustração consigo e já não conseguia mais segurar a barra do mundo dentro de sua cabeça. Em um quase surto, porém consciente. Ele começou pedindo um tempo para si mesmo, para que ele pudesse se entender e devolver todo o seu amor a Janaína amada. Um dos problemas foi financeiro e o outro, a insistência de Janaína em lhe pedir ao menos compreensão.

Ele a nega porque não consegue entender a si mesmo. Ela insiste e, pela primeira vez, depois de sete anos, Teobaldo passa a noite inteira deitado sem conseguir dormir, tendo apenas pensamentos pertubadores. Uma semana depois de noites mal dormidas, Teobaldo rebentina todos os seus demônios. Ele que nunca havia tratado mal nenhuma pessoa, o fez como nunca pudera imaginar. Agredir com palavras é pior do que um murro; é pior que uma paulada. Foi como cortar a carne de sua alma gêmea.

Esse acesso de fúria ocorreu na calada da noite. Ele não pôde deixar sua mulher amada na sarjeta. Sua consciência age, após essa expurgação. Ela, falando por sua alma, pede-lhe perdão e que não se vá. Com lágrimas somadas ao seu desespero aceita o amor de Teobaldo. Sem medo, e com certeza de que não haverá arrependimento.

Ele deita em seu colo e chora, por extensas horas. “Nunca me perdoarei por faltar-lhe com este respeito”. Ela lhe diz para não falar bobagem e não consegue pensar em nada, apenas em lhe consolar.

Depois, pelas 5h, o casal consegue dormir para acordar às 9h e irem trabalhar. Foi o abraço mais gostoso de suas vidas. Tudo voltou a ser como era antes. Amor e pureza. Não há livros que possam descrever o quão intenso foi aquele abraço. Aperto gostoso, simbiótico de alivio e conforto.

Porém, quando Janaína acorda, percebe que Teobaldo não está com ela, abraçando-a. Ela parte pela casinha de dois quartos lhe chamando.

-Amor... vamos tomar café;
-Amor... você está no banheiro?

Por último, no segundo quarto, ela encontra Teobaldo na forca, jaz sem vida. Ela senta, chora; e meio conformada chama os bombeiros.


De Maria para Teobaldo

- Meu único amor. Por que você fez isso conosco? Não somente, mas para com todos de nossas famílias, trabalho e que nos serpeiam. Essa é a maior violência que um ser humano pode fazer com o outro. Ninguém sabe o que se passou na sua cabeça. Mas na nossa, de quem fica, é a mais absoluta tristeza e sentimento de impotência de não ter podido lhe ajudar. Você está na história da minha vida e me marcou como nenhum outro.
Seu maior erro foi perdoar a todos os mortais, e como em um flagelo por não se sentir perfeito, não conseguiu se perdoar. Você deu todo o seu amor ao universo, mas faltou amor à sua própria pessoa. Agora, eu consigo, mas é dificíl conseguir me perdoar. Por mais que minha razão me dê certeza de que não tive culpa. Fica um vácuo em minha mente. E se eu não tivesse me envolvido, você estaria vivo? A matemática é precisa e o destino também. E colocar “se” nos meus questionamentos não ajuda, só atrapalha. O destino seria este? Mas Deus me pôs no seu caminho por quê? Agora, o meu legado é sua família e a minha, que permanecem unidas. Mas lhe confirmo, nada foi em vão. Nosso amor continua florescendo. Parta em sua missão para onde quer que você vá. Mas nosso amor continua sendo construído.


Maria virou missionária católica e partiu para o novíssimo continente. Morreu de velhice praticando a bondade por meio da religião e construindo seu amor com Teobaldo. Também em vida ensinou a todos que aceitavam ouvir suas palavras para amar uns aos outros e a amar a si próprio.

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