sexta-feira, 9 de outubro de 2015

O guia definitivo sobre Tararau Por Pedro Wolff Quem já sentou em algum boteco de Brasília com certeza se deparou com aquele cara que vende incenso. Personalidade/patrimônio da cidade, onipresente e querido por todos, a noite traz e leva Tararau. De piso macio, longa cabeleira, colete e bolsa perfumada ele saúda a todos com o seu “tudo em órbita” ou “vocês estão fazendo parte de uma reunião secreta”. Um caleidoscópio biohumano, Tararau carrega com amor seu projeto musical em seu estúdio e ainda é voluntário da Cruz Vermelha Internacional. Você sabia que durante a Copa do Mundo ele prestou apoio ao SAMU aos turistas? Usando do que talvez seja seu maior trunfo: a linguagem. Aquele vendedor carismático domina o francês e ainda arranha um espanhol, italiano, espanhol e inglês. Mais do que os vários idiomas, é do ser simpático e de seu coleguismo para conquistar todos os clientes de Brasília. E assim sobreviver de sua arte. Pode parecer pouco, imagina a trabalheira de intervir mesa por mesa e sempre deixar boas vibrações, mesmo entre os mais sisudos. É porque borogodó ele tem de mais. Seu codinome Tararau nasceu diante dessa necessidade de quebrar o gelo quando praticava trocadilhos bem elaborados na mineira Uberaba ainda nos anos 2000. “Tenho incensos de flores, jardim, cravo, canela e etc e tal e Tararau”. Deste artifício para sobrevivência, o povo de lá lhe imortalizou com tal alcunha. Para entender um pouco mais desse fenômeno urbano é sugerida a leitura de seu livro autobiográfico “Pequeno Perfil de um Camelô”. A obra é uma “mundivisão ou visão global e pessoal, incluindo o hiperespaço (antológico metafísico) e uma forma viva e maneira positiva de encarar o mundo”. Nessas páginas, Milton Leite Tosta dá pistas sobre sua vida e filosofia e descobre-se que ele viveu com os pés descalços até os 12 anos no Sul de Minas. Em um estilo de vida “neolítico”, ou seja, na transição da pré-história até os dias atuais. Chama atenção em sua literatura o relacionamento que tinha com pássaros e a descrição que faz de cada um deles. Em sua criação, crianças armavam arapucas para capturar os passarinhos. Os que sabiam cantar eram vendidos e os que não iam para a panela alimentar uma família composta por ele, um irmão e dois avós. “Já era autônomo desde os cinco anos de idade”, orgulha-se Tarareco. Hoje o próprio reconhece como crueldade, mas na época não tinha julgamentos e era sobrevivência. De todos os pássaros descritos em cada uma de suas “macrobioéticas”, o trabalhador joão-de-barro tem uma empatia especial do autor pelo fato de construir uma casa a prova de tempestades, criar seus filhos e depois ir embora deixando o imóvel a disposição para o próximo animalzinho. E como incansável trabalhador constrói outra casa em outro canto. Essa descrição foi fruto da relação peculiar com um joão-de-barro de Brasília. Em 2010, Tararau seguia para comprar uma salada de fruta em uma parada de ônibus na W3 norte. Lá ele observou um vendedor despejar a agua do isopor na terra e da lama formada vinha um joão-de-barro de uma única pata recolher a lama para construir sua moradia. Essa observação durou por um ano até que o passarinho sumiu.Um ano e meio depois ele ouviu do seu Zé do Meu bar sobre um tal de "pedreiro". Surpreso ficou o camelô vendedor de incensos que o tal trabalhador era o mesmo pássaro que agora recolhia a lama gerada pelo outro ser humano. E segundo Tararau, este passarinho perneta reside até hoje por aquelas bandas. Linha do tempo Tararau não bebe e não faz uso de nada. Ele começa sua jornada de andarilho dos aromas às 20h30, a partir de seu estúdio musical no final da Asa Norte. De lá ruma ao sul fazendo uma média de 30 a 40 bares por noite. Antigamente ficava até mais tarde, mas teve que se adaptar ao horário de fechamento da Lei Seca. Conta que no começo achou ruim, mas depois se adapto e hoje mais prático e rentável, porque trabalha focado em um menor tempo. “Até mesmo para quem trabalha nas zonas de diversão noturna preferem porque alegam que quem chega depois das 2h já veem bêbado de outros lugares e geralmente são barulhentos”. Milton Leite Tosta, atualmente com 53 anos, se criou em Sertãozinho da Borda da Mata (MG). Aos 12 largou Minas e foi para Paulínia (SP) onde adolesceu. Até que aos 20 anos, em 1982, ganhou o mundo quando decidiu ir para a Bahia de dedão. Na volta esteve em Brasília pela primeira vez e foi a São Paulo para comprar material necessário para poder fazer artesanato. Descontente com a situação de desempregado saiu para fazer uma viagem experimental prevista de seis meses a região amazônica, que na realidade durou dois anos. “Depois disso não consegui mais parar de viajar. Demorei quase um ano para chegar ao Norte. Na volta desci pelo Nordeste até o Rio de Janeiro e ainda passei novamente por Brasília”, relata. Tararau conta que gostou muito da Capital da Esperança e decidiu se instalar pela primeira vez em 84. Na época vendia coisas como artesanato, pão de queijo e torta de banana nos bares na noite. Um marco significativo da sua carreira ocorreu nos idos de 85, à época do Plano Cruzado do Sarney, aprendeu a trabalhar com prata em Pirenópolis (GO). Até que um amigo lhe convidou a ir à França. Era difícil,começou lá com prata e tocando música nas áreas externas dos bares, locais semelhantes aos encontrados hoje no Campinense. Ele ainda auxiliava a capoeiragem do amigo tocando berimbau e pandeiro. Juntou-se a dupla um mágico suíço à qual Tararau era responsável pela parte musical. Destaque na labuta para participação na peça dos Saltimbancos em um festival de música medieval em Foix, no Sul da França. Até voltar ao Brasil. Quando na década de 1990 ficou marcado como um verdadeiro pingue-pongue dos sentimentos entre Brasil e Europa. Visitava um amigo lá e depois voltava para encontrar um amigo de cá”.E segue até hoje nesse ritmo, tanto que esteve ano esteve novamente na Europa. Escala e ascensão de trabalho Tararau resume como foi a evolução do seu trabalho. Que a prata lhe deu autonomia para poder viajar até a Europa, coisa que não conseguiria com o artesanato. Na zoropa, a música lhe deu uma autonomia que a prata não permitia: a mobilidade. “Essa coisa de cultura corporal em movimento, desde pequeno não paro quieto e isso me faz bem a saúde”. Nessas andanças pelo mundo foram geradas duas filhas, uma que tem hoje com 24 anos que reside em Belém do Pará e outra que mora na França, com 22 anos. O ano de 2000 foi quando Tararau decidiu morar definitivamente em Brasília pelo fato dele ter sido muito bem recebido e onde de fato começou a trabalhar com incenso propriamente dito. Essa história começou em 1998 quando fechou uma loja de artesanato em Pouso Alegre (MG).Colocou tudo da loja dentro de um ônibus e partiu para a capital do seu país. Até que quando em Uberaba (MG), o ônibus quebrou e por lá ficou. E comprou um Fiat Panorama onde transferiu tudo do ônibus e seguiu rumo ao Planalto Central. Tararau ainda usou este carro por bons anos em Bsb até seu falecimento. Aqui ele materializou o seu projeto de montar um estúdio musical. Hoje ele vende, além de incensos, seu CD de músicas autorais e seu E-book. Desta maneira segue Tararau,de modo a contribuir com o patrimônio histórico e cultural do indivíduo e de um povo, em seu espaço e em seu tempo, dentroda medida do possível, narrando, relatando e descrevendo, certificando e cientificando as imensas dificuldades que enfrenta todo e qualquer trabalhador comum, estudante, escritor ou cientista que decida trilhar ou construir caminhos alternativos, com maior liberdade e autonomia para expressar seus sentimentos e sua compreensão acerca da realidade.

Um comentário:

  1. Parabéns pelo detalhado guia desse ser com um talento incrível. Tive o prazer de conhecer ele tocando em volta de uma fogueira em São Jorge Chapada dos Veadeiros. Saberia dizer se existe versões digitais das músicas dele disponívels para compra?

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